A preocupação com o hálito é comum e, até certo ponto, saudável — afinal, o mau cheiro na boca pode estar associado a problemas bucais, digestivos ou respiratórios. No entanto, quando o receio de estar com mau hálito persiste mesmo diante de exames normais, o que está em jogo pode ser mais do que uma questão de higiene: trata-se de um distúrbio chamado halitofobia.
“O termo também é conhecido como pseudo-halitose. A pessoa tem a percepção persistente de que apresenta mau hálito, mas não há qualquer comprovação clínica ou exame que confirme essa alteração”, explica a Dra. Lígia Maeda, otorrinolaringologista e especialista em halitose do Hospital Paulista.
Embora ainda pouco conhecida do público em geral, a halitofobia tem impacto real na vida de quem sofre com ela. “É uma condição que pode causar grande sofrimento psicológico, gerar ansiedade intensa e até levar ao isolamento social”, afirma a médica.
Diagnóstico exige exclusão de causas reais
Segundo a especialista, o primeiro passo no manejo da halitofobia é uma avaliação clínica detalhada, justamente para afastar a possibilidade de que o mau hálito realmente exista.
“Fazemos uma investigação completa, que inclui o exame físico, histórico clínico e testes específicos para identificar compostos voláteis presentes na respiração. Quando todos os resultados são normais, passamos a considerar o diagnóstico de pseudo-halitose”, explica a Dra. Lígia.
Apesar da ausência de evidências clínicas, o sofrimento do paciente é legítimo — o que exige sensibilidade por parte do profissional de saúde. “É fundamental acolher essa angústia, explicar com clareza os resultados e, quando necessário, encaminhar o paciente para acompanhamento psicológico ou psiquiátrico”, diz.
Ligação com transtornos psiquiátricos
Casos persistentes de halitofobia podem estar associados a transtornos como ansiedade generalizada ou transtorno obsessivo-compulsivo (TOC). Em alguns pacientes, a preocupação com o hálito se transforma em um comportamento obsessivo, que pode incluir escovação excessiva dos dentes, uso constante de enxaguantes bucais ou até evitação de contato social.
“A pessoa passa a moldar sua rotina com base no medo de ter mau hálito. Deixa de falar próximo de outras pessoas, evita reuniões, encontros e, em casos extremos, até o convívio familiar”, relata a otorrinolaringologista.
Por isso, o tratamento costuma ser multidisciplinar, envolvendo dentistas, otorrinos e profissionais da saúde mental. “Não é raro que o paciente rejeite, a princípio, a ideia de um encaminhamento psicológico. Mas com um bom vínculo médico-paciente, é possível mostrar que se trata de um cuidado necessário, e não de um julgamento”, afirma a Dra. Lígia.
Busca por informação ainda é limitada
Apesar de afetar um número significativo de pessoas, a halitofobia ainda é pouco discutida fora dos consultórios. Para a especialista, o tabu em torno do mau hálito — associado à vergonha ou à falta de higiene — acaba contribuindo para o silêncio em torno do tema.
“É importante desmistificar o mau hálito e trazer informação qualificada. Nem todo mau hálito está ligado à higiene bucal, e nem toda preocupação com o hálito é infundada — mas quando o medo se torna maior do que a realidade, precisamos olhar com atenção”, conclui a médica.