O governador eleito do Tocantins, Marcelo Miranda (PMDB), acompanhado da vice-governadora Cláudia Lelis (PV) recebeu hoje (18), de sua equipe de transição, um diagnóstico das contas do governo estadual e um mapa de riscos sobre as áreas que estão sendo e poderão vir a ser atingidas pela atual crise financeira. Segundo ele, a situação é “preocupante” e exigirá “austeridade” da próxima administração, que terá que fazer cortes de pessoal, enxugamento da estrutura administrativa e ampliar as receitas para reequilibrar as finanças.
Desde o fim do processo eleitoral, o Tocantins vem sofrendo com a interrupção ou queda significativa na qualidade de diversos serviços públicos devido à falta de pagamento do governo local a fornecedores, servidores públicos e empresas prestadoras de serviços. Os reflexos impactaram negativamente principalmente sobre a saúde, a segurança pública, os programas de assistência social, o investimentos previstos para o setor cultural e não realizados e obras de infraestrutura lançadas no período eleitoral e descontinuadas nos últimos dias.
“Quando na campanha dizíamos que era preciso um choque de gestão no Governo do Tocantins não era somente retórica, sabíamos que o desgoverno era grande demais. O governo Siqueira/Sandoval ampliou as suas despesas e comprometeu o limite prudencial, mais do que isso, fez aplicações temerosas no mercado financeiro com os recursos do IGEPREV nos levando a perder o Certificado de Regularidade Previdenciária, e isso é letal para o bem estar da administração pública. E na outra ponta, vimos os hospitais num estado de calamidade pública, carros das policias militar e civil sendo recolhidos, serviços de assistência social interrompidos. O quadro de crise é muito pior do que imaginávamos”, analisou o governador eleito.
Herbert Brito (o Buti), já anunciado como futuro Secretário-Geral do Governo e que coordenou os trabalhos da Comissão de Transição, classificou ainda como incompreensível ainda não haver sequer previsão do orçamento do primeiro ano do próximo governo o que pode prejudicar, e muito, Marcelo Miranda. “O bom seria ela ser discutida com a equipe de transição, mas não está sendo discutida conosco. É o atual governo que está decidindo quando vai enviar e o presidente da Assembleia Legislativa já deu declarações à imprensa de que o governo não teria enviado a LOA por não ter sido capaz de fechar as contas. Veja o tamanho do problema que temos pela frente”, destacou Buti.
Na apresentação dos relatórios da Comissão de Transição nessa quinta-feira, participaram os seis integrantes oficiais escolhidos pelo governador: o advogado e ex-secretário de Segurança Pública do Estado, Herbert Brito (o Buti), que coordenou os trabalhos; Luiz Antônio da Rocha, que foi um dos coordenadores da campanha de Miranda e já atuou no Tribunal de Contas do Estado (TCE); o ex-senador por Goiás Jacques Silva de Souza, que trabalhou na Controladoria nos Governo de Siqueira e Miranda Miranda, e é egresso do Tribunal de Contas da União (TCU); Deocleciano Gomes Filho, corregedor-geral da Procuradoria do Estado; Adão Francisco de Oliveira que é professor da Universidade Federal do Tocantins (UFT) e doutor em Geografia e Igo Nascimento é contador, bacharel em Direito e especializado em auditoria governamental.
A relatoria e sistematização dos trabalhos ficou sob a tutela do Professor, administrador e consultor em gestão pública Edson Cabral. A mediação dos trabalhos de hoje coube ao próximo secretario Estadual da Comunicação, jornalista Rogério Silva. Presenças também dos secretários já anunciados para a próxima gestão. Todos os técnicos que participaram dos eixos temáticos também prestigiaram o evento, e receberam os agradecimentos do governador eleito Marcelo Miranda pelo trabalho voluntário realizado.
A metodologia de trabalho adotada
Com vistas a construir um diagnóstico, ainda que parcial, inicialmente, a equipe de transição elegeu uma matriz padrão, posteriormente, por meio da Controladoria Geral do Estado - CGE, solicitou-se a relação de documentos que pudessem demonstra a situação atual de cada órgão que integra a estrutura governamental, buscando dados tanto de natureza orçamentária quanto operacional.
Além dos documentos, a equipe analisou o relatório de acompanhamento de execução físico e financeira, disponibilizado no Portal da Controladoria Geral do Estado - CGE, as informações postadas nos Portais das instituições, além de reuniões com gestores e técnicos em cada pasta, oportunidade em que foram coletados depoimentos que muito contribuíram para conclusão dos trabalhos.
Desenvolvimento Econômico, Sustentabilidade e Recursos Naturais
O grupo de trabalho que trabalhou a temática do desenvolvimento econômico, sustentabilidade e recursos naturais, coordenada por Igo Nascimento, detectou que todas as entidades contempladas seguem um padrão quanto a alocação orçamentária, ou seja, os recursos orçamentários oriundos dos cofres do tesouro estadual são consumidos basicamente com despesas de pessoal, ficando portanto desprovidos para custeio e investimentos, como consequência estruturas operacionais insuficientes ou sucateadas para atender a população, além de restos a pagar processados e não processados para serem liquidados no exercício seguinte.
Os técnicos que se detiveram sobre essas temáticas, notaram que as fontes
financiadoras, tem suas atividades finalísticas co-financiadas por outros
entes, especialmente pelo Governo Federal, destacando um aporte significativo
de recursos captados, porém, observando as datas de celebração dos referidos
instrumentos regulatórios, constataram uma execução ineficiente. A equipe
aponta que é indispensável suscitar, a construção de mecanismos que melhorem o
desempenho na execução de recursos advindos de transferências voluntaria ou
co-financiados.
Para o contador Igo Nascimento “embora grande parte dos convênios e contratos
encontre-se em execução, a análise de execução física e financeira ficou
prejudicada por falta de informações sobre a evolução operacional dos mesmos.
No tocante a avaliação estratégica e operacional, a equipe contou apenas com os
dados disponibilizados no portal da CGE, pois, na documentação encaminhada
pelas instituições, com algumas exceções, não foi possível extrair informações
que permitisse apuração mais acurada sobre resultados qualitativos ou
quantitativos das Entidades”.
Educação, Cultura, Esporte Ciência e Tecnologia
Coordenada pelo procurador do Estado Deocleciano Gomes Filho a principal
dificuldade encontrada na leitura das informações apresentadas foi a
inconsistência de dados, principalmente financeiros, que encontraram
divergências com os dados da CGE no volume de restos a pagar processados e não
processados. Outras dificuldades encontradas pela equipe foi a pouca
informação atualizada de convênios, pouca clareza nos dados de pessoal e de
gestão das ações propostas no PPA, que influenciaram negativamente na análise
das informações, sendo necessária, ás vezes, a busca por informações por vias
não oficiais, como por meio da contribuição de servidores das pastas.
A grande preocupação a foi com o volume da dívida dos órgãos citados, bem como com a folha de pagamento dos mesmos, que pode comprometer a gestão, sendo necessário um estudo mais profundo quanto ao impacto que estas podem ter sobre o orçamento geral do Estado. “No caso da Fundação Cultural que está no âmbito da SEDUC, praticamente foi impossível fazer um levantamento detalhado, a área foi completamente abandonada e recursos originalmente destinados ao setor cultural foram remanejados. Na Educação, percebemos que temos unidades escolares em boas condições e outras que colocam em risco até mesmo o bem estar dos alunos e servidores, e no geral, falta qualidade de ensino conforme preconiza a legislação. Pra completar temos casos de dívidas enormes, só para ficar em um exemplo, somente da Feira do Livro de 2012, a Educação deve mais de R$ 2,5 milhões, um quadro preocupante”, explicou Deocleciano Gomes.
No caso da Unitins detectou-se um grande problema com o excessivo gasto com a folha de pagamento, e a falta de uma estrutura adequada. Na opinião da equipe a Unitins acabou absolvendo alguns cursos universitários municipais sem a devida estrutura e quadro de professores para fazê-lo de forma adequada, o que vai exigir um trabalho sistemático dos próximos gestores para se adaptar às exigências preconizadas pelo Ministério da Educação.
Por último a equipe destacou que os programas voltados para a Juventude e no combate à disseminação das drogas não obteve a devida atenção do Governo Estadual, nem mesmo no campo pedagógico e de convênios federais que poderiam ter sido selados para uma atuação mais agressiva e eficiente nessas áreas.
Desenvolvimento Social, Saúde, Segurança e Direitos Humanos
Coube ao servidor de carreira do Tribunal de Contas da União, Jacques Silva de Souza, coordenar os trabalho sobre desenvolvimento social, saúde, segurança pública e direitos humanos. A equipe ressaltou perante o governador Marcelo Miranda e a vice-governador Cláudia Lelis que a documentação apresentada e as informações colhidas não foram suficientes para demonstrar com precisão a real situação de cada órgão. Todavia, conclui-se que a situação, de um modo geral, apresenta um quadro preocupante para a futura administração, uma vez que foram constatadas dívidas elevadas, alto comprometimento da receita com despesa de pessoal, contratos com indícios de superfaturamento, bens móveis e imóveis sucateados, inexecução de serviços essenciais, notadamente na saúde. Os fundos, de modo geral, possuem uma baixa execução na aplicação dos recursos, com exceção do Fundo Estadual de Saúde e de Assistência Social.
Jacques Silva ressalta que “a política de participação social se dá por meio dos Conselhos de caráter consultivos e deliberativos, no entanto poucas foram às ações implementadas, com vista ao fortalecimento dos mesmos. E no caso da Assistência Social os recursos foram basicamente aplicados apenas em custeio e manutenção, deixando de observar aplicabilidade da Política Nacional de assistência social nos municípios”. Por essa razão, Jacques Silva disse ao governador que será preciso assegurar a efetividade dos programas de Proteção Social Básica e Proteção Social Especial, bem como a execução de projetos na área de Segurança Alimentar, combatendo a subnutrição e a fome da população pelo aproveitamento de recursos naturais e programas disponibilizados pelo Ministério de Desenvolvimento Social. Uma ação emergencial para ser tomada já nos primeiros meses da nova administração.
A equipe constatou também uma baixa execução das políticas voltadas para a defesa dos Direitos Humanos, entre as quais se destacam as políticas destinadas para a Pessoa Idosa, Pessoa com Deficiência, Crianças, Adolescentes, Jovens e Mulheres, neste último caso, por exemplo, não houve sequer destinação de recurso orçamentário para o Fundo Estadual dos Direitos da Mulher.
Na segurança observou-se um aumento da criminalidade agravado, principalmente, pela falta de estrutura dos órgãos de combate e repressão ao crime, o que implica também, de consequência, negativamente no sistema prisional que hoje é deficitário, com unidades superlotadas e infraestrutura totalmente inadequadas, necessitando de providências urgentes, notadamente quanto à construção e reforma de unidades prisionais, bem como formação e capacitação de pessoal para o exercício das pertinentes funções e, sobretudo, na implementação de Políticas Sociais de caráter preventivo.
Na Saúde a equipe constatou aquilo que a população já vem observando no dia-a-dia, uma total precariedade das unidades hospitalares do Estado, com recorrentes falta de medicamentos e materiais, interrupção de serviços ante a ausência de pagamento de fornecedores e prestadores de serviços, descumprimento de decisões judiciais, equipamentos sem manutenção adequada, falta de correta higienização dos hospitais, aumentando a incidência de infecções, superfaturamento de preços de medicamentos, prática de corrupção e desvio de recursos da saúde.
Infraestrutura , Mobilidade e Habitação
Esta equipe, coordenada pelo Professor Adão Francisco mergulhou nos dados das Secretarias de Estado da Infraestrutura; da Habitação, Cidades e Desenvolvimento Urbano; Extraordinária de Estado da Região Metropolitana de Gurupi; Extraordinária de Estado de Minas e Energia; Agência Tocantinense de Saneamento – ATS; Agência Tocantinense de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos – ATR; IPEM - Agência Estadual de Metrologia, Avaliação da Conformidade, Inovação e Tecnologia (transformada em AEM); Terra Palmas; DETRAN – TO; MINERATINS; Agetrans.
Na análise geral da equipe destacaram como positivo a eficiência da Secretaria de Estado das Cidades, Habitação e Desenvolvimento Urbano, que tem cumprido parte significativa de suas ações e feito o uso dos recursos na obediência dos prazos. Por outro lado, a Secretaria de Estado da Infraestrutura evidencia uma relativa fragilidade no cumprimento de suas funções, haja vista que algo próximo a 60% das rodovias estaduais não estão pavimentadas e do total das que estão, 57% carece de restauração, de acordo com dados de 2014.
Com relação ao Terra Palmas, o órgão é dirigido pelo atual titular da pasta da Secretaria de Estado das Cidades, Habitação e Desenvolvimento Urbano. Em visita a este órgão, a convite do secretário, nos foi informado que a não prestação de informações relativas ao Terra Palmas se dava pelo fato de o mesmo ter uma natureza jurídica distinta dos órgãos da administração direta, não sendo alcançado, portanto, pelo Decreto da Transição, que instituiu as informações que deveriam ser informadas, segundo a sua interpretação, o que fere, na prática da Lei de Acesso à Informação Pública. Todavia, o secretário de Estado e presidente do Terra Palmas garantiu, verbalmente, que este órgão encontra-se ajustado, com saúde financeira e com recursos significativos para investimentos, algo que a comissão não teve como checar por falta de dados.
Com relação ao Detran a equipe detectou que vários softwares foram adquiridos por valores significativos para integrar o sistema do Detran ao Sistema Nacional, mas que não se investiu em modernização dos equipamentos físicos de informática, o que inviabilizou que esse trabalho tivesse êxito. Os técnicos também questionarão uma série de convênios com alto valores, que segundo eles, precisarão passar por uma auditoria.
Com relação aos demais órgãos, a equipe atribuiu notas entre 2 e 3, numa escala de 1 a 5, para os procedimentos burocrático-administrativos (eficiência) e também 2 e 3 para o cumprimento dos objetivos das ações (eficácia).
Gestão e Governabilidade
Coube ao ex-servidor de carreira do Tribunal de Contas do Estado de Goiás, Luiz Antônio de Carvalho trabalhar na temática de Gestão e Governabilidade e junto com sua equipe analisar os dados da Secretaria do Planejamento e Modernização da Gestão; Secretaria da Administração; Secretaria da Fazenda; Casa Civil; Controladoria Geral do Estado; Procuradoria Geral do Estado; Secretaria de Comunicação Social; Agência Tocantinense de Notícias; REDESAT; Representação do Estado em Brasília-DF; Secretaria de Relações Institucionais; e IGEPREV.
Na análise da equipe existe em todas as unidades do Estado um grau de endividamento que compromete efetivamente todas as possibilidades de realização de investimentos e até mesmo o custeio básico da máquina pública. Tal comprometimento, refletido sobre o custeio e outras despesas correntes, gera um efeito inevitável de impossibilidade de manutenção qualitativa e quantitativa dos serviços públicos, inclusive aqueles essenciais e básicos. Esse cenário foi possível mediante o comprometimento das receitas do Estado com o pagamento de despesas com pessoal e ainda endividamento além das condições de pagamento aferidas pela receita total do Estado. Tal reflexo é perceptível em todas as unidades administrativas do Estado, e não apenas naquelas objeto de análise desse eixo temático.
Na opinião de Luiz Antônio de Carvalho “podemos afirmar que Pastas estratégicas para o Estado como SEPLAN, SEFAZ e SECAD foram privadas de suas funções, como planejadores de novas soluções para dinamização e desenvolvimento de iniciativas a bem e modernização do serviço público. Em termos práticos, a SEPLAN privou-se de planejar ações de curto, médio e longo prazo para o Estado, desde aquelas estratégicas quanto aquelas de análise efetiva das projeções orçamentárias do Estado”.
Quanto ao IGEPREV Luiz Antônio de Carvalho destacou grande parte das aplicações foram feitas de forma irregular o que gerou punições do Ministério da Previdência que geraram dois TACS – Termos de Ajustamento de Conduta, que acabaram não sendo cumpridos, o que coloca em risco que o Estado possa renovar o seu Certificado de Regularidade Previdenciária, o que seria um caos, pois bloquearia a administração de selar qualquer tipo de convênio com o Governo Federal. Na opinião de Luiz Antônio ao se iniciar o Governo será necessário contratar uma auditoria independente para auditar o Instituto.
Superar a Crise com um Choque de Gestão
O administrador e consultor em gestão pública Edson Cabral, fez um arremate sobre as receitas e despesas do governo de uma forma geral, ressaltando que hoje o estado praticamente não realiza investimentos em infraestrutura porque a folha de pagamento compromete as finanças do governo. Cabral destacou que apesar do ICMS ter experimentado um crescimento houve uma grande frustração do FPE – Fundo de Participação dos Estados, e faltou iniciativas de incremento de arrecadação. E, por último chamou a atenção para o quadro de pessoal que hoje se encontra acima do limite prudencial, o que compromete o que preconiza a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ao final da apresentação dos relatórios o governador Marcelo Miranda agradeceu o empenho de todos, se comprometeu a se deter nos próximos dias nos dados apresentados e determinou que uma cópia do relatório completo fosse também disponibilizado para cada secretario já indicado para que eles possam ter um roteiro que os guie nos primeiros dias de administração a partir de 01º de janeiro.
Para Marcelo Miranda “a nova administração tem uma tarefa grandiosa de tirar o Tocantins de uma situação de crise profunda e fazê-lo retornar aos trilhos do progresso, renovando as esperanças de todos que aqui escolheram morar, trabalhar, estudar e ajudar o estado a crescer”. Mas o governador lembrou a todos, que será preciso preparar o espírito para um período de austeridade e trabalho duro, como forma de salva o Estado de uma possível bancarrota.
Por último ele lembrou a todos que o trabalho realizado não pode ser visto como uma auditoria, visto as dificuldades que foram apresentadas por todos quanto ao levantamento de dados, e mesmo a parcialidade de muitos números apresentados e consolidados até 31 de outubro somente. Marcelo Miranda fez um chamamento para que todos se detenham nos primeiros meses de trabalho a auditar com transparência todos os órgãos, e que todas irregularidades encontradas sejam explanadas e encaminhadas aos órgãos competentes.