Faltam políticas públicas nas áreas da regulamentação
fundiária, saúde, educação, transporte, infraestrutura, saneamento básico, energia
elétrica, entre outras, que garantam a permanência das famílias quilombolas em
suas terras. Se essa realidade não mudar daqui a alguns anos, a pequena Lilian Vitória
Ribeiro de Souza, de 8 meses, residente na Comunidade Quilombola de Lageado,
município de Dianópolis, provavelmente não residirá em sua comunidade assim
como tantas crianças, jovens e adultos remanescentes dos quilombos, que lutam
diariamente pela garantia dos seus direitos fundamentais.
Tais constatações foram apresentadas durante Audiência Pública realizada nesta sexta-feira,
26, no Sindicato de Trabalhadores Rurais de Dianópolis, pela Defensoria Pública
com representantes de cinco comunidades quilombolas da Região Sudeste do
Estado: Lageado, de Dianópolis; São Joaquim e Laginha, localizadas em Porto
Alegre do Tocantins; Baião e Poços Dantas, de Almas; bem como representantes
das Prefeituras Municipais, Poder Judiciário e Governo do Estado e Federal.
Mais de 130 pessoas participaram da audiência.
“O problema de uma é o problema de todas as comunidades quilombolas; não estamos
pedindo nada fora do alcance do poder público, existe recurso e lei para isso.
Muitas vezes nós não somos bem atendidos quando buscamos os órgãos, mas nós não
estamos pedindo favor, estamos exigindo direitos. Se nos é garantido o direito
total, não queremos pela metade”, desabafou Celenita Gualberto Pereira, 31
anos, Secretária da Associação da Comunidade Quilombola de Lageado.
Para o defensor público Hud Ribeiro Silva, diretor do Núcleo Regional de Dianópolis
e coordenador do Núcleo da Defensoria Agrária a injustiça social do campo
precisa ser extinta. “Os quilombolas estão sem luz, sem água, crianças tendo
aula à céu aberto, mesmo existindo as verbas federais para essas demandas elas
não chegam às comunidades. O campo está ficando velho, os jovens são obrigados
a deixar o campo, pois não há políticas que garantam sua permanência em suas
terras”.
O coordenador do Núcleo de Ações Coletivas, defensor público Arthur Luiz Pádua Marques,
apresentou os relatórios confeccionados durante as visitas realizadas pela
equipe do Programa Defensoria Quilombola nas cinco comunidades em novembro de
2012. Foram expedidos cerca de 30 ofícios e 6 recomendações às Prefeituras
Municipais e Secretarias de Estado referentes às demandas dessas comunidades.
“É preciso garantir infraestrutura mínima para essas comunidades historicamente
renegadas. A prioridade da política pública do Tocantins não é agricultura
familiar, não são os pequenos; quando nós pisamos nas comunidades quilombolas,
percebemos que as políticas públicas desaparecem. Muitas vezes elas são
impostas, sem ouvir a comunidade, sem fazer audiência publica”, frisou Arthur
Pádua.
Os quilombolas reclamam que faltam escolas, saneamento básico, energia elétrica,
estradas vicinais, atendimento básico à saúde. Segundo os moradores, muitas
vezes a água é imprópria para o consumo e escassa em determinadas épocas do
ano, pois as cisternas secam. “A gente sofre muito com a falta de água, tem uma
cisterna lá em casa que a gente pega água para beber, lavar roupa, cozinhar,
fazer tudo. Tem um Córrego, mas é longe. A água é só essa mesma e já estamos
entrando no período da seca”, contou a quilombola da Comunidade Baião,
Inocência Crisotomo Pinheiro, de 76 anos.
O juiz da Vara Civil de Dianópolis, Jossaner Neri Nogueira, avaliou o trabalho realizado
pela Defensoria Pública junto às Comunidades Quilombolas do Tocantins. “Esse é
um trabalho de primeira grandeza, pois resgata uma dívida histórica do Estado
Brasileiro frente a essas pessoas marginalizadas pelo regime de escravidão, que
só tende a melhorar a qualidade de vida dessa população na busca pela garantia
dos seus direitos.
“O que a Defensoria Pública quer é a garantia dos direitos básicos dessas pessoas,
pelo menos. Auxílio técnico e suporte para que possam produzir, água tratada
para todos, acesso irrestrito à educação e à saúde, fornecimento de energia
elétrica, bem como a regularização fundiária do território para que possam
cultivar o necessário para garantir seu sustento dignamente, não ficando assim,
obrigados a mendigar favores a quem quer que seja, pois o que não falta nessas
pessoas, é vontade de trabalhar e produzir, mesmo sendo tudo realizado com os
braços”.
Durante a Audiência Pública foram feitos encaminhamentos, entre eles: propor convênio
com a FOZ/SANEATINS para realizar a análise de todas as águas das comunidades
quilombolas do Estado; incluir as comunidades quilombolas nos programas de
baixa renda da FOZ/SANEATINS e Celtins; oficiar sobre as casas de farinhas
disponibilizadas para o Estado e remanejá-las para quem realmente precisa;
recomendar para que seja requerido junto à esfera federal tratores para atuação
rural; entre outros.
Além dos presidentes das cinco Associações das Comunidades Quilombolas, participaram
da Audiência Pública o juiz da Vara Civil de Dianópolis, magistrado Jossaner
Neri; o promotor de Justiça Luiz Francisco; o secretário de Administração de
Almas, Iris Alves, representando o prefeito Leonardo Sintra; o vereador Edson
Bistscof de Moura, representando o prefeito de Dianópolis, Regis Melo;
secretário geral de Porto Alegre do Tocantins, Josmar Dias de Melo,
representando a prefeita Edvan Pereira Nepomuneceno Sousa; vereadores dos
municípios de Dianópolis, Almas e Porto Alegre; e ainda representantes das Secretarias
Estaduais de Agricultura, Educação e Defesa Social, FUNASA, Ruraltins,
Sindicato de Trabalhadores Rurais de Dianópolis, FOZ/SANEATINS, Celtins e Banco
da Amazônica. (Ascom)