O V Simpósio Internacional para o Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, marcado para os dias 16 e 17 de abril, em Fortaleza/CE, vai discutir o combate a quadrilhas que exploram 2,4 milhões de pessoas em todo o mundo e lucram US$ 32 milhões por ano, segundo dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). No Brasil, a atuação desses grupos criminosos levou a Polícia Federal a abrir, de janeiro de 2010 a março deste ano, 374 inquéritos para investigar o tráfico doméstico e internacional de pessoas para fins de exploração sexual, sendo que 35 deles foram instaurados neste ano. Os interessados em participar do evento podem se inscrever até o dia 8 de abril por meio do Portal CNJ.
"A quinta edição do Simpósio Internacional, organizado pelo CNJ, consolida a importância para que o sistema de Justiça cada vez mais se envolva com medidas estratégicas para o enfrentamento ao tráfico de pessoas, renovando o compromisso institucional do Poder Judiciário de aplicar as leis com maior celeridade e segurança para uma definição de possíveis responsabilidades em prazo razoável", afirmou o conselheiro do CNJ Guilherme Calmon, coordenador-geral do simpósio. A coordenação científica está a cargo do juiz de direito Rinaldo Aparecido Barros, do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO).
O simpósio será realizado na sede do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (TRT7), parceiro da iniciativa. Será um espaço de discussão entre os agentes que lidam com o problema e também de reforço de sua capacitação profissional. Ao todo, são oferecidas 200 vagas para o evento, assim distribuídas: 80 para magistrados dos Tribunais Regionais Federais, Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunais de Justiça; e 120 para membros do Ministério Público, representantes do Ministério da Justiça, advogados públicos (Defensoria Pública da União, dos estados e Advocacia-Geral da União), auditores fiscais do Trabalho, polícias Judiciária e Administrativa, secretarias de Educação e da Saúde e Rede de Atendimento às Vítimas.
Escravidão
O combate ao tráfico de pessoas está nas agendas de governos e agências internacionais de todo o mundo. Segundo as Nações Unidas, 80% das vítimas são exploradas como escravas sexuais. O tráfico também está relacionado à doação involuntária de órgãos, casamentos forçados, servidão doméstica, mendicância forçada, trabalho escravo e imigração ilegal.
Na opinião do conselheiro Guilherme Calmon, “ainda há grande dificuldade na identificação e investigação dos casos relacionados ao tráfico de pessoas, sendo importante também a alteração da lei brasileira a respeito do tema”. A questão será abordada no simpósio. Calmon comemorou a aprovação, pela Câmara dos Deputados, em fevereiro, do Projeto de Lei n. 7.370/2014, que endurece a legislação sobre esse tipo de crime. Uma das principais mudanças é que passarão a ser consideradas atividades de tráfico de pessoas a adoção ilegal, a remoção de órgãos e o trabalho escravo. Na legislação atual, essa tipificação ocorre apenas quando há exploração sexual. O projeto de lei ainda depende da aprovação do Senado.
Sobre o tráfico de pessoas para fins de exploração sexual, alvo dos 374 inquéritos instaurados pela Polícia Federal desde 2010, foram deflagradas operações em diferentes estados e também no exterior. Em 24 de outubro de 2013, por exemplo, cinco pessoas foram presas em São Paulo, acusadas de pertencer a uma quadrilha que traficava mulheres brasileiras para Angola, na África. Nessa mesma operação, batizada como Garina, a Justiça Federal decretou a prisão de dois estrangeiros que se encontravam fora do País. Seus nomes foram incluídos na lista mundial de procurados pela Interpol, a polícia internacional.
Aliciamento
Segundo a Polícia Federal (PF), a Operação Garina durou um ano, com a obtenção de provas de que as vítimas eram aliciadas pelos criminosos em casas noturnas paulistanas, mediante promessa de pagamento de US$ 10 mil dólares, para se prostituírem em Angola pelo período de uma semana. Além disso, brasileiras receberam até US$ 100 mil para se relacionar sexualmente com um rico empresário e ex-parlamentar angolano, conforme o inquérito. A PF apurou indícios de que parte das vítimas foi privada de sua liberdade no exterior e obrigada a manter relações sexuais sem preservativos com clientes estrangeiros. Para essas vítimas, os criminosos ofereciam um falso coquetel de drogas anti-AIDS, segundo a investigação.
Outra operação, batizada como Planeta, foi deflagrada pela PF em 30 de janeiro de 2013 em parceria com o Corpo Nacional de Polícia da Espanha. As ações ocorreram simultaneamente nos dois países, com a prisão de duas pessoas no Brasil. Em território espanhol, também houve prisões, além do fechamento de duas casas de prostituição.
Já em relação à imigração ilegal, essa modalidade de tráfico de pessoas também foi alvo das operações da PF. Uma delas, batizada de Coiote, foi realizada em 10 de fevereiro deste ano, quando cinco pessoas foram presas em Goiás e Minas Gerais, suspeitas de integrar uma quadrilha que levou 150 brasileiros para os Estados Unidos da América e movimentou R$ 3,5 milhões. A operação envolveu 200 policiais e contou com o apoio da Interpol.
Ligue 180
No Brasil, também a Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República atua contra esse tipo de crime. Por meio da central telefônica Ligue 180, o órgão registrou, em 2012, um total de 58 denúncias de tráfico interno e internacional de mulheres. Em 2013, o número de comunicações subiu para 340. No ano passado, caiu para 140.
O Ligue 180, ou Central de Atendimento à Mulher, funciona 24 horas por dia, em todos os dias da semana, inclusive sábados, domingos e feriados. O serviço realiza atendimentos variados: informações, reclamações, elogios, sugestões, serviços e relatos de violência, incluindo o tráfico de mulheres. Semestralmente, são lançados relatórios com o consolidado de informações sobre os atendimentos realizados no período. Desde 2008, são realizadas capacitações periódicas com as atendentes da central.
Em março deste ano, o Ligue 180 teve sua estrutura ampliada para aprimorar o atendimento no Brasil. No mesmo mês, também houve a implantação do serviço em 13 países, de onde as vítimas poderão ligar e ser atendidas: França, Estados Unidos, Inglaterra, Noruega, Guiana Francesa, Argentina, Uruguai, Paraguai, Holanda, Suíça, Venezuela, Bélgica e Luxemburgo. A implantação já havia ocorrido na Espanha, em Portugal e na Itália. Todos esses países foram escolhidos por já terem abrigado brasileiras vítimas do tráfico internacional de pessoas. As instruções para a utilização do serviço estão no site da Secretaria de Políticas para as Mulheres. (CNJ)