A imprensa nacional trouxe a exaustão que o ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro firmou acordo de delação premiada com a Policial Federal. Referida colaboração foi homologada pelo ministro Alexandre de Morais, após oitiva de Mauro Cid. Embora o termo delação premiada esteja na boca de quase todos os brasileiros, fruto da sua exagerada utilização durante a operação Lava Jato, o que vem a ser esse importante instrumento jurídico? Qual a sua importância no ordenamento brasileiro? Quais são seus requisitos de admissibilidade?
A colaboração premiada é um acordo realizado entre o acusador/autoridade policial e defesa, com o objetivo de facilitar a persecução penal, com o descortinar dos fatos que estão sendo apurados e a obtenção de elementos de prova para a punição da organização criminosa, em troca de benefícios ao colaborador, reduzindo as consequências sancionatórias à sua conduta delitiva.
O artigo 3º - A da Lei nº 12.850/13 estabelece que: “O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e interesse públicos”.
Não há dúvida que a delação premiada é um instrumento importante no contexto da legislação brasileira, na medida em que objetivo de combater e desmantelar a criminalidade organizada e garantir a obtenção de informações relevantes para investigações e processos judiciais.
A delação premiada, conforme se extrai do próprio artigo 3º - A da Lei nº 12.850/13, tem natureza de negócio jurídico celebrado entre o Ministério Público, o réu acusado de um crime e, em alguns casos, a autoridade policial. Sua natureza jurídica, portanto, é de acordo formal, em que o réu se compromete a fornecer informações substanciais sobre crimes e a estrutura da organização criminosa em troca de benefícios legais, como redução de pena ou até mesmo a concessão de perdão judicial em casos excepcionais.
Ressalte-se que, para que a delação premiada seja homologada pela autoridade judicial é necessário atender a determinados requisitos: a) Voluntariedade: o acordo deve ser firmado de forma voluntária pelo réu, sem coação ou pressão indevida ; b) Informações Substanciais: o réu deve fornecer informações relevantes para a investigação ou processo, como detalhes sobre a autoria, a materialidade do crime e a participação de outros envolvidos; c) Colaboração Efetiva: o colaborador deve colaborar de forma efetiva com as autoridades, prestando depoimentos completos e auxiliando nas investigações e; d) Legalidade: o acordo deve estar em conformidade com a lei e não pode envolver crimes que não sejam passíveis de delação.
Quais são as etapas do procedimento de delação premiada?
Inicia-se com a negociação preliminar, momento em que o réu/investigado ou seu advogado inicia as negociações com o Ministério Público ou a autoridade policial, visando estabelecer os termos do acordo.
Uma vez alcançado o acordo, este é formalizado por escrito e assinado pelo réu/investigado e pelos procuradores.
Ato contínuo, o acordo é submetido ao juízo competente, que avalia se os requisitos legais foram cumpridos e se o acordo é benéfico para a investigação ou processo em questão. Estando tudo em termos, o acordo é homologado.
Homologado o acordo, o colaborador deve cumprir as obrigações previstas no documento firmado.
Conforme o artigo 4º da Lei 12.850/13, o colaborador deve, fundamentalmente, identificar os demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas e revelar a estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa.
Efetivamente cumpridas as obrigações previstas no termo de acordo, o réu/investigado pode receber os benefícios pactuados, que geralmente envolvem a redução de pena ou outros benefícios como a prisão domiciliar.
O acordo de delação firmada pelo coronel Mauro Cid e homologado pelo ministro Alexandre de Moraes, aparentemente seguiu todas as etapas legais. Houve negociação preliminar, posteriormente foram reduzidos a termo a minuta do acordo, estabelecendo as condições para a sua efetivação. Antes da homologação, Mauro Cid foi ouvido, longamente, por um juiz instrutor.
Resta agora a efetivação do acordo, com apresentação, por Mauro Cid, de todos os elementos de prova que corroborem a sua delação. Não se pode olvidar que a delação não é meio de prova, mas sim meio de obtenção de prova, que devem ser apresentadas pelo colaborador, para que esse obtenha os benefícios legais. Há que se ter muito cuidado, para que se tenha o mesmo desfecho da Lava Jato, com a destruição de reputações, famílias, empresas e ao final tudo ser anulado.
*Marcelo Aith é advogado, latin legum magister (LL.M) em direito penal econômico pelo IDP (Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisa), especialista em Blanqueo de Capitales pela Universidade de Salamanca (ESP), mestrando em Direito Penal pela PUC-SP e presidente da Comissão Estadual de Direito Penal Econômico da Abracrim-SP.