A recente divulgação de dados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) revelou que o INSS é o epicentro da litigiosidade contra a União, respondendo por impressionantes 87% das ações federais em tramitação. São 3,8 milhões de processos, a maioria deles movidos por pessoas que apenas querem ver reconhecido um direito básico – o acesso digno a benefícios previdenciários.
A maioria dessas ações envolve benefícios por incapacidade, como auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, além de aposentadorias por tempo de contribuição ou especiais. A razão para tanta demanda judicial é conhecida: perícias médicas mal conduzidas, sistemas ineficientes, ausência de orientação e lentidão no atendimento.
O impacto disso ultrapassa o drama pessoal dos segurados. O que se vê é um colapso sistêmico que sobrecarrega tribunais, gera insegurança jurídica, atrasa pagamentos legítimos e aumenta os gastos públicos com honorários, perícias e custas processuais — despesas que poderiam ser evitadas com uma estrutura mais eficiente.
O que tem sido feito? Iniciativas como o DataJud, do Conselho Nacional de Justiça, e a plataforma Pacifica, da AGU, são esforços relevantes. O primeiro, ajuda a mapear e compreender os focos da litigiosidade. O segundo busca resolver conflitos antes que se tornem ações judiciais, especialmente nos casos em que benefícios foram negados sem justificativa consistente. Essas ferramentas têm potencial, mas ainda são paliativas diante da profundidade do problema.
É preciso encarar a questão como uma urgência econômica e institucional. A desjudicialização da Previdência não será alcançada apenas com boas plataformas tecnológicas. Ela exige mudança de cultura institucional, investimento em qualificação técnica, valorização do atendimento humano e revisão de procedimentos que hoje penalizam o segurado em vez de protegê-lo.
Essa judicialização em massa não é apenas um sintoma da ineficiência do sistema. É, acima de tudo, um alerta sobre os custos econômicos e sociais da má gestão pública. Cada processo judicial representa não apenas um gasto para o Judiciário e para os cofres da União, mas também um cidadão ou cidadã à espera, por meses ou anos, de uma resposta que deveria vir de forma administrativa, célere e justa.
Enquanto o sistema não se transforma, a judicialização seguirá sendo, para milhões de brasileiros, o único caminho para obter um direito básico. E o Estado precisa mudar sua rota ou seguirá pagando por sua própria ineficiência, em todos os sentidos.
*Simone Lopes é advogada especialista em Direito Previdenciário e sócia do escritório Lopes Maldonado Advogados.