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Mundo Pet

Foto: Divulgação

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O Brasil enfrenta um surto de esporotricose felina, doença causada por fungos do gênero Sporothrix spp, que já atingiu animais e humanos em todas as regiões do país. Altamente infecciosa, a enfermidade provoca lesões cutâneas e pode ser transmitida por arranhões, mordidas ou contato direto com secreções de gatos contaminados. As autoridades de saúde mantêm o alerta diante do avanço da infecção, considerada uma das mais preocupantes zoonoses do cenário atual.

O primeiro registro da esporotricose no país ocorreu em 1955, mas foi a partir de 2023 que a situação passou a representar risco de descontrole. O número de casos cresce de forma contínua, com notificações obrigatórias em diversas capitais e a confirmação de ao menos uma morte humana neste ano. “É um grave problema de saúde pública. Para se ter uma ideia, o fungo já se tropicalizou e gerou uma espécie 100% nacional, a Sporothrix brasiliensis, que é muito mais transmissível e já está se espalhando para fora do Brasil”, explica o professor titular de medicina veterinária da UNIP, Carlos Brunner.

A doença tem afetado especialmente gatos domésticos e de rua, considerados os principais transmissores. As lesões surgem inicialmente como pequenos nódulos que evoluem para úlceras com secreção, de difícil cicatrização. Em humanos, a infecção se manifesta principalmente nas mãos, braços e rosto, podendo atingir órgãos internos em pessoas com imunidade comprometida. O tratamento tradicional, baseado em antifúngicos, é longo, caro e nem sempre eficaz, o que tem levado à recomendação de eutanásia em muitos casos.

O impacto da doença varia de acordo com o estado. Em São Paulo, foram notificados mais de 1.700 casos humanos em cerca de 100 municípios em 2024. No Amazonas, até setembro de 2025, 1.469 pessoas foram diagnosticadas, com uma morte confirmada. Entre os animais, o boletim estadual registrou 3.559 gatos infectados e 1.660 eutanasiados. Em Manaus, clínicas veterinárias precisaram criar alas específicas para atendimento, enquanto os tutores demonstram receio diante da possibilidade de contágio.

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Diante das limitações do tratamento convencional, novas abordagens vêm sendo estudadas. O professor Brunner, especialista em eletroquimioterapia, lidera uma pesquisa que aplica pulsos elétricos na pele do animal para eliminar o fungo. A técnica, ainda em fase de testes, está sendo utilizada em clínicas e universidades, como a PUC de Curitiba e a Fundação Fiocruz, no Rio de Janeiro. “A esporotricose é infecciosa e agressiva. O tratamento com antifúngico é demorado e muitas vezes não traz os resultados esperados”, comenta o pesquisador.

O método dos eletropulsos cria poros na pele, que permanecem abertos apenas nas células do fungo, levando-o à morte, enquanto o tecido do animal é preservado. O procedimento demanda menos manipulação dos gatos, reduz custos e encurta o período de recuperação, fatores que podem beneficiar clínicas e organizações que atuam no resgate de felinos.

Em São Paulo, a ONG Esporinhos, criada em 2023, adotou a técnica experimental após observar falhas nos tratamentos orais. A entidade abriga e cuida de animais com esporotricose, mantendo parceria com pesquisadores e clínicas. A fundadora, médica-veterinária Susana Pastor Pazini, reforça que o combate à doença depende de uma ação conjunta. Segundo ela, é necessário ampliar campanhas de conscientização, estimular a castração e evitar que gatos tenham acesso livre às ruas, o que reduz a transmissão entre colônias urbanas.

A disseminação da esporotricose expõe a fragilidade das políticas públicas de vigilância zoonótica e o desafio de equilibrar saúde animal e humana em um contexto de expansão urbana e abandono de animais. O avanço da pesquisa em eletropulsos representa uma alternativa viável, mas especialistas defendem que apenas uma resposta integrada entre poder público, profissionais e tutores poderá conter o surto e restabelecer o controle sobre a doença.