O juiz Océlio Nobre, designado para a Comarca de Guaraí, condenou a Igreja Universal do Reino de Deus a pagar o valor de R$ 300 mil, a título de indenização por danos morais, a uma moradora de Guaraí. Além disso, a igreja deverá pagar os honorários dos advogados fixados pelo juiz em 10% sobre o valor atualizado da condenação.
A sentença decorre de uma ação de indenização ajuizada pelo pai de uma vítima de estupro praticado por um então auxiliar de pastor da igreja naquele município, quando a vítima possuía 13 anos. Hoje a vítima está com 18 anos. Em outra ação, na esfera penal, o auxiliar de pastor foi processado e condenado por esse crime.
Nesta ação de indenização, sentenciada na segunda-feira, 17, a defesa da igreja alegou, entre outras afirmações, que o autor do crime não é preposto da Igreja e, sim, apenas um simples membro, sem qualquer função dentro da estrutura hierárquica da entidade.
Para o juiz, em termos técnico-jurídicos, não há documento formal que indique o autor do estupro como representante da igreja, mas que ele se apresentava, perante a comunidade religiosa como um representante da Igreja. Assim, conclui o juiz, a figura do auxiliar de pastor, em relação à igreja, não decorre de documento jurídico, mas de sua atuação diária “que fazia crer que sua atuação era em nome da Igreja”.
A defesa também tentou invalidar o depoimento de testemunhas, inclusive a mãe da vítima, que estaria impedida por “comunhão de interesses”. Para o juiz, o testemunho da mãe, porém, tem validade jurídica. “A mãe não é compromissada exatamente porque se sabe que ela é comprometida com os fatos de tal forma que não ostenta a isenção necessária e, portanto, terá uma valoração diferenciada, em relação às testemunhas compromissadas”, anota o juiz na sentença.
Na sentença de 14 páginas, o juiz analisa diversas teses da defesa para desassociar a relação entre o autor de estupro e a Igreja e conclui pela responsabilização da entidade. “O autor do estupro de vulnerável se valeu da posição de representante da Igreja e do espaço de confiança por ela criado, facilitando, assim, intento libidinoso do pastor auxiliar, ideia central que leva à responsabilização civil” da igreja.
O magistrado também afirma que o ordenamento jurídico do País protege “a dignidade sexual da mulher” através das leis penais (o julgamento do crime do estupro) e civis (a responsabilidade civil, que procura reparar a vítima através de uma justa indenização de caráter reparatório e de sanção). “Portanto, inafastável a responsabilidade civil da igreja, devendo a mesma indenizar a autora pelos danos causados por um de seus membros”, escreve o juiz na sentença.
Ao justificar o valor da indenização o juiz observou as diversas sequelas deixadas na vítima. “Por ser a vítima, à época dos fatos, uma adolescente, o valor deve ser elevado, dado que as sequelas são mais notáveis e, considerando, ainda, o fato de o delinquente tê-la raptado, mantendo-a sob seu poder por vários dias. Também, considero, na valoração do quantum indenizatório, a sedução que precedeu o estupro, não para minorar o valor, mas para agravá-lo, dado que sendo uma criança (adolescente tecnicamente), há as sequelas psicológicas pela criação do afeto inútil, sem perspectivas e contra toda a estrutura familiar e educacional, levando-a abandonar a família, um valor sublime que a ordem jurídica protege. A vítima, sem experiência, foi seduzida pelo agressor, sofrendo não só pelo ato carnal, mas também pela sequela afetiva, da desilusão a que foi exposta tão cedo na vida”.
Além disso, o juiz observa que a ré pode suportar a quantia fixada que, além de reparar o dano, levará a igreja a reforçar “a vigília em defesa da confiança social da qual desfruta, exigindo de seus prepostos fáticos maior respeito”.
Cabe recurso da sentença para o Tribunal de Justiça. (Cecom/TJTO)