O Brasil é um dos países com maior população de animais de estimação do mundo, contando com mais de 160 milhões de pets, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). Esse mercado robusto é movido por um sentimento cada vez mais comum: o amor que os tutores dedicam a seus bichinhos. Uma pesquisa do Opinion Box reforça que dois em cada três brasileiros enxergam seus animais como verdadeiros filhos.
Roupinhas, camas e outros cuidados passam a fazer parte dos “direitos” do pet. No entanto, quando esse casal se separa, surge a questão: assim como acontece na guarda compartilhada dos filhos, com quem ficam os animais?
Separação ou divórcios já são casos delicados e emocionais, e a decisão de quem cuidará do animal de estimação também faz parte dessa comoção. Esses pets ainda são considerados bens materiais no Brasil, sendo tratados como “objetos” no momento da separação de bens. Contudo, a sociedade tem mudado sua visão sobre o assunto, inclusive juízes concordam que os pets devem ser tratados com mais carinho e atenção.
Apesar de não haver lei que defina isso, alguns critérios são analisados no momento da partilha, explica o coordenador do curso de direito da Afya Faculdade de Palmas, prof. Guilherme Augusto M. Santos. “Na prática, os juízes analisam alguns pontos, como: Quem cuidava mais do pet no dia a dia (alimentação, passeios, consultas no veterinário), por exemplo. O laço de afeto que o animal tem com cada tutor, quem tem melhores condições de garantir conforto e qualidade de vida (tempo livre, espaço adequado, recursos para alimentação e saúde). Em alguns casos, se há crianças ligadas ao pet, para evitar mais mudanças na vida delas”, pontua.
Enquanto avança lentamente no Congresso a proposta de reforma do Código Civil, o Poder Judiciário presencia um aumento significativo de ações que disputam a guarda e até mesmo a pensão alimentícia para animais de estimação. O tema tornou-se relevante a ponto de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ter reconhecido que a relação entre tutores e seus pets integra o direito de propriedade, devendo ser regulada pelas normas do regime de bens aplicável à união.
Atualmente, a legislação civil ainda enquadra os animais na categoria de “bens móveis semoventes”. Mas, o Congresso Nacional debate a possibilidade de reconhecê-los legalmente como “seres sencientes” – capazes de sentir dor, prazer e emoções –, além de prever juridicamente a existência das “famílias multiespécie”.
De acordo com o professor da Afya Palmas, as discussões visam assegurar o bem-estar dos animais. “Uma mudança importante está no projeto do novo Código Civil, que tramita no Congresso. A proposta já inclui a definição dos animais como seres sensíveis e estabelece a possibilidade de regulamentar a guarda, o direito de visita e as responsabilidades de cada tutor em caso de dissolução da união”, destaca.
Adotar um cão ou um felino é uma prática que alegra a casa, traz segurança e diversos benefícios, mas também gera gastos. Saúde, alimentação, higiene e lazer são alguns exemplos. Com isso, em caso de separação, pode ser necessário até mesmo o pagamento de pensão para o animal.
Diante do aumento das disputas pela posse dos animais nos processos de divórcio, a Justiça tem admitido a fixação de pensão alimentícia para assegurar seu sustento. Um exemplo recente ocorreu no Mato Grosso, onde um médico foi condenado a pagar R$ 500 mensais à ex-companheira para ajudar nos custos de cinco cães que pertenciam ao casal, após o fim da união estável. O valor, equivalente a R0 por animal, foi estipulado para cobrir despesas essenciais, como alimentação, consultas veterinárias e medicamentos.
O casal pode fazer alguns acordos visando o bem-estar do animal, explica o professor Guilherme, que reforça que animais de estimação não devem ser usados como instrumento de barganha ou vingança contra ex-cônjuges e a decisão sobre a tutela do mesmo deve ser decidida sempre pensando no bem-estar do animal. “Alguns cuidados podem evitar brigas no futuro: Fazer um acordo escrito definindo com quem o animal ficaria em caso de separação e se haverá visitas, incluir cláusulas específicas sobre os pets em documentos como união estável ou pacto antenupcial, registrar o pet em nome de ambos, em clínicas veterinárias ou em chipagem, para mostrar a responsabilidade conjunta, conversar abertamente sobre o assunto desde cedo, para alinhar expectativas e evitar conflitos”, finaliza o professor.